Mais um dia na
favela da Rocinha... não era justo eu estar aqui, mas o dinheiro da
recompensa fez parecer justo. Já faz quinze dias que estou de tocai
em uma casa de madeira em uma dessas vielas fétidas. Dizem que esse
lugar melhorou? É porque não estão aqui tanto tempo quanto eu, nem
tanto tempo quanto as famílias que moram aqui. Mas elas parecem
gostar, alias não fazem nada pra mudar essa situação. Carlos
Teixeira já vai pro seu terceiro mandado como prefeito do Rio de
Janeiro e é um dos piores pilantras que eu já conheci... mas, pelo
menos é bom de cama.
– Colt? – Sempre
que eu ouvia essa voz, minhas pernas tremiam. Não porque o Capitão
Borges era um negro de uns 2 metros de altura, com uma cicatriz na
bochecha esquerda, com um corpo de fisiculturista, que usava uma
farda preta que tinha mais cheiro de sangue do que a roupa da própria
morte, não, não era por isso...
– Borges.
– Seu alvo vai
sair da toca essa noite – ele se aproximou mas do que o necessário,
tive que olhar para cima para continuar a encará-lo, meu pai sempre
dizia para encarar as pessoas – Não faça sujeira aqui, estamos
entendidos? – me transmitiu a informação, virou-se e saiu. Minhas
pernas ainda tremiam.
Modesta a parte, eu
sempre faço o meu trabalho bem feito, mas um aviso do Borges, bem, é
sempre bom de se ouvir.
Coloquei as poucas
coisas de que precisava pra sair dali o mais rápido possível, pus
meu colete Hipist sobre medida, coturnos ok, medalha de São
Possenti, ok, amor da mamãe, vulgo Enfield L42, ok! Adeus Rocinha! E
juro que farei igual a Carlota Joaquina quando chegar ao aeroporto.
Comecei a me
esgueirar na noite. Os moradores quando me viam vindo, entravam em
suas casas, tá ai, gosto de pessoas espertas!
Era uma noite sem
lua ou estrelas, apenas nuvens carregadas, eu precisava ser rápida.
Meu telefone toca, mas não é o comum...
– Qual é o
problema Jack? – Ah! Eu esqueci de dizer, Jack era um japa que eu
trouxe comigo, ele é bom em derrubar sistemas de seguranças e a
mansão do meu alvo, era repleto deles, mas infelizmente eu não
entendia muito bem o que ele falava, ainda bem que ele me entendia,
isso era o que importava.
Pelo o que eu
decodifiquei da ligação, estava tudo limpo, pronto pra eu entrar, e
bem, se não estivesse, minhas duas macaquinhas nunca saim da minha
cintura mesmo.
Meia-noite, o baile
começou, e quem está fazendo a proteção do local? Um bando de PMs
de merda. Não gosto de matar mais do que o necessário, aliás mais
corpos é mais atenção, menos munição, sem remuneração, esse é
meu lema! Mas o problema não era os PMs fazendo a ronda do baile, o
problema era porque eles estavam fazendo isso, Heitor Veloso dos
Santos Barbosa ou Caquinho. Era o novo chefe do tráfico por ali e
sim, ainda tem tráfico na Rocinha, ele na verdade nunca saiu, mas
isso não é problema meu, mas gente ruim, mais dindin pra mim. Porém
meu foco não era o baile, era o casarão atrás dele, pra ser mais
exata, meu foco estava no segundo andar terceira porta a direita.
– Sabe qual é a
porra do problema Verônica, caso seja esse mesmo o seu nome, você é
muito previsível – Quatro homens extremamente armados até os
dentes, pera, aquilo nas costas do segundo é um lança granada? –
Mas nós te pegamos, você e o seu ratinho chinês – Jogaram Jack
morto, repleto de ferimentos e sem os dois dedos da mão esquerda à
minha frente, acho que quando ele me ligou não quis dizer que era
pra eu subir.
– Você sobe o meu
morro, sem a minha permissão e acha que vai ficar assim mermo sua
vadia? – O quinto homem era Caquinho, sua única arma era uma
Taurus 44 banhada a ouro, alias, ele era um varal para ouro, tinha
até nos dentes, literalmente dessa vez – Mas num tem problema não,
porque vou encher tua boca de formiga, assim como eu fiz com o china,
acho até que vou fazer uma homenage pa ele, vou escrever na lapide
“China! Queria cane, queso e flango” – ele e seus capangas
começaram a rir enquanto eu planejava como ia sair dali, precisava
ganhar tempo.
– Olha só, quer
dizer que você sabe escrever? – O primeiro homem tinha o segundo
braço fraturado, era recente, começaria por ele, usaria ele como
escudo enquanto com a sua barreta matava o cara três que tinha
miopia e era o único sem colete – Porque na atual situação do
Brasil, você um menino que tem uma história tão sofrida, que veio
de tão de baixo ne?! – o segundo cara era gordo e lento, deixaria
ele por último quando eu corresse na direção de Caquinho, um
segundo antes do grandalhão engatilhar a escopeta e um segundo
depois de fincar minha Bowie na carótida de Caquinho.
– Sua Puta! Ta me
tirando? Senta o ferro nela!
Levei cinco minutos
a mais que o planejado, o homem três tinha astigmatismo, doença
errada, droga! Mas, pelo menos não gastei minha munição, contudo,
de brinde acho que o gordão conseguiu fraturar uma das minhas
costelas flutuantes.
Caquinho ainda
estrebuchava no chão, precisei de dois golpes com a faca, para
abatê-lo de verdade. Idiotamente ele tentava estancar o sangramento
com as mão. Eu precisava ir, mas não podia deixar de lhe explicar
uma coisa:
– Seu nome era
Jack e ele era japonês, otário.
1:45h da manhã,
estava ficando sem tempo. Mesmo com a costela fudida, tive que entrar
na casa pela janela da cozinha. O sistema de segurança havia sido
desligado, pelo menos Jack havia feito o seu trabalho. Mas estava
fácil demais, silencioso demais e vazio demais, cheguei no segundo
andar sem nenhum empecilho.
Adentrei no quarto
do meu alvo, ela estava dormindo. Seu pijama de coelhinhos,
maria-chiquinhas loiras e abraçando um minion. Seu nome era Samanta,
tinha 7 anos e sua vida custava meio milhão de reais.
Coloquei o
silenciador na minha 22. O dinheiro e a passagem de avião, me
esperavam as 2:30h na Praça XV.
– Eu não faria
isso se fosse você – reconheci a voz de imediato.
– Boa noite Borges
– sem exitar, puxei o gatilho.
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